Ao contrário das eleições autárquicas que elegem diretamente o órgão executivo, as eleições legislativas elegem o órgão legislativo, isto é, a Assembleia da República.
Ao contrário do que afirmaram alguns partidos, e a comunicação social badalou, as eleições legislativas elegem deputados e não o primeiro-ministro.
É a arrumação de forças na Assembleia da República que determina as possibilidades de formação de governo, podendo este ser composto ou não pela força política mais votada. Há na Europa muitos exemplos que demonstram esta característica das democracias parlamentares.
A Constituição da República consagra a democracia parlamentar não há espaço para tornar ilegítima, mesmo à sombra da tradição pois as circunstâncias políticas são diferentes, qualquer solução parlamentar na formação de governo.
O Presidente da República, mesmo contra a sua vontade, terá que atender ao imperativo constitucional.
A coligação PSD/CDS está confundida e baralhada, os militantes e comentadores, padralhada incluída, que sustentam a tese “arco do poder”, vomitam reacionarices anticomunistas logo antidemocráticas.
Podemos, sem especular, determinar qual a reação de tais “democratas” se a CDU obtivesse maioria relativa na Assembleia da República.
As eleições legislativas demonstraram a condenação da política do Governo PSD/CDS, sucessivamente em confronto com a Constituição, perderam 700 mil votos e a posição maioritária na Assembleia da República.
A necessidade política imediata é travar a política de austeridade prosseguida pela coligação PSD/CDS nos últimos 4 anos.
Perante este quadro parlamentar e atendendo à necessidade urgente de travar esta política o Partido Comunista Português admitiu discutir as questões do programa de Governo, mesmo sabendo que o programa do PS não responde a uma aspiração de rutura.
Há riscos associados a esta posição: excessiva imagem de esquerda do PS e ideia de cedência política.
No entanto, as circunstâncias políticas resultantes das eleições permite travar esta política, não permite a rutura. É nesta condição que nos devemos focar.
A posição justa e inteligente do PCP permite defender direitos fundamentais e obriga o Partido Socialista a definir-se. E agora PS?
Não estou iludido com o Partido Socialista, conheço a sua prática política, a contínua traição à esquerda e registo as posições anticomunistas de destacados elementos “socialistas”, mas não poderá o PS continuar, aos olhos do povo, a ambiguidade política armado com a falsa tese de sectarismo político do PCP.
Entendo que o PS, fruto das profundas contradições políticas, vive um momento delicado, qualquer opção poderá levar à cisão partidária. O PS parece, hoje, não servir ao capital nem iludir o trabalho. A expressão política do PS poderá ser, no futuro, residual.
A possível “pasokização” do PS poderá conduzir à necessidade de “syrização” do BE com as consequências conhecidas: ilusão das massas e fragilização da luta por um modelo económico e social que imponha o progressivo derrube dos alicerces do capitalismo.
No contexto da democracia representativa sustentada no voto, espécie de procuração facilmente traída, entendo a Assembleia da República como um espaço de luta onde é possível obter ganhos a favor dos trabalhadores, não é, contudo, um instrumento de transformação social e económica.
Só a luta de massas poderá determinar a rutura com esta política, só a participação efetiva dos trabalhadores e do povo terá força suficiente para construir um modelo político, social e económico que corresponda às suas aspirações.
Mário Figueiredo - 13/10/2015